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2024: o ano que pode encerrar alguns que não terminaram

Ao contrário do que muitos acreditam, nem todo professor de História é marxista. Esse
estereótipo é uma maldade de direitistas, pois não conseguem explicar por que a
maior parte dos historiadores desse país tem uma predileção pela esquerda. Eu tenho
uma tese: conhecer a tragédia que foram os quase 400 anos de escravidão, as
inúmeras “viradas de mesa” que as elites deram sobre as classes populares e o medo
quase irracional dos ricaços de se promover mudanças, mesmo que pequenas,
explicam essa preferência dos seguidores da Musa Clio, os historiadores, pelo campo
da canhota.
Faço esta provocação inicial, porque sou um historiador “de esquerda”, mas
não sou um marxista. Mas devo dizer que aprendi e aprendo muito com o Velho
Barbudo Alemão, Karl Marx. Principalmente com o melhor texto de política dele, o
clássico 18 Brumário de Luís Bonaparte. Permita, leitor, que eu conte a história desse
livro. Marx perseguido político atuou quase a vida toda como jornalista. Escreveu
centenas de reportagens, para dezenas de jornais na Europa e nos EUA. Uma delas foi
a que deu origem ao livro citado. A revolução francesa de 1789 fez com que sempre
que houvesse grandes movimentações políticas na França, sempre o mundo queria
saber o que estava rolando por lá. Em 1848, depois de uma revolução derrotada, a
França elege o sobrinho de Napoleão, Luís Bonaparte presidente da República. Os anos
que se seguiram foram da criação de um regime autoritário chamado bonapartismo.
Marx, malandro, escreve em janeiro de 1852 que o segundo Bonaparte iria fazer o
mesmo que o tio, se transformar em imperador e acabar, mais uma vez, com a
república na França. Coisa que ocorreu em 2 de dezembro de 1852. Dez meses depois
da “profecia” de Karl.
Marx percebeu que Luís iria repetir o seu tio Napoleão, de tal modo que o velho
barbudo começa o texto com a célebre frase, uma paráfrase a outro filósofo, Hegel:
“Na história as coisas ocorrem duas vezes, uma como tragédia e a segunda como
farsa”. Mas há outra frase nesse texto que me impressiona mais. No fim do texto,
antes de Luís virar Napoleão III, Marx disse que se ele “deitasse sobre os ombros o
manto imperial" deveria ser a última empreitada monárquica na França. A França tinha
passado por uma alternância maluca entre monarquia e república que se encerrou em
1870, quando o sobrinho do baixinho perdeu a Guerra Franco – Prussiana para a
nascente Alemanha. Depois disso, como havia previsto Marx, a França nunca mais teve
um rei.
Ok, Gabriel, onde você quer chegar com esse papo maluco, você poderia me
perguntar. Respondo. As retenções de oficiais das Forças Armadas, o indiciamento de
generais e almirantes, neste 8 de fevereiro, apontam para futuras prisões e a uma
possibilidade histórica importantíssima. Pela primeira vez militares podem “ir em
cana” por tentar dar golpe de Estado. Punir os golpistas de 2022, 2023 pode ter uma

clara relação com as análises do velho Marx. Pode ter sido o 8 de janeiro a última vez
que os milicos tentaram deitar sobre os ombros o manto golpista. Se assim for, temos
um bom apelido para o ano de 2024, o ano que encerrou muitos outros. 1889, 1937,
1964, 2023. O ano que o Brasil se livrou do fardo golpista das suas Forças Armadas.

Texto escrito por Gabriel Pereira da Silva Bastos, graduado em História pela UFF e
professor

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